Página:Origem das espécies (Lello & Irmão).pdf/335

Wikisource, a biblioteca livre
INSUFICIÊNCIA DOS DOCUMENTOS GEOLÓGICOS
309

duzir no espírito uma impressão análoga à que resulta das nossas vãs tentativas para conceber a ideia da eternidade.

Esta impressão não é portanto absolutamente justa. M. Croll fez notar, numa memória interessante, que não nos enganamos por «uma concepção mais elevada do comprimento dos períodos geológicos», mas avaliando-os em anos. Quando os geólogos vêem fenómenos consideráveis e complicados, e que consideram em seguida os números que representam milhões de anos, as duas impressões produzidas no espírito são muito diversas, e os números são imediatamente considerados insuficientes. M. Croll demonstra, relativamente à desnudação produzida pelos agentes atmosféricos, calculando a relação da quantidade conhecida de materiais sedimentares que transportam anualmente certos ribeiros, relativamente à extensão das superfícies drenadas, que seriam necessários seis milhões de anos para desagregar e para elevar ao nível médio da área total, que se considera, uma espessura de 1 000 pés de rochas. Um tal resultado pode parecer surpreendente, e sê-lo-ia ainda se, após algumas considerações que podem fazer supor que é exagerado, fosse reduzido a metade ou a um quarto. Muito pouca gente avalia exactamente o que significa na realidade um milhão. M. Croll procura fazê-lo compreender pelo seguinte exemplo: estenda-se, no muro de uma grande sala, uma faixa estreita de papel, do comprimento de 33 pés e 4 polegadas (25,70m); faça-se depois na extremidade desta faixa uma divisão de uma décima de polegada (2,5mm); esta divisão representa um século, e a faixa inteira representa um milhão de anos. Ora, para o assunto que nos ocupa, o que será um século figurado por uma medida tão insignificante rclativamente às vastas dimensões da sala? Numerosos tratadores distintos têm, durante a vida, modificado muitíssimo alguns animais superiores e criaram verdadeiras sub-raças novas; ora, estas espécies superiores produzem-se muito mais lentamente do que as espécies inferiores. Poucos homens se têm ocupado com cuidado de uma raça por mais de cinquenta anos, de modo que um século representa o trabalho de dois tratadores sucessivos. Não seria necessário supor, todavia, que as espécies no estado natural possam modificar-se tão prontamente como o podem fazer os animais domésticos sob a acção da selecção metódica. A comparação seria mais justa entre as espécies naturais e os resultados que dá a selecção inconsciente, isto é, a conservação, sem intenção preconcebida de modificar a raça, dos animais mais úteis ou mais belos. Ora, sob a influência da simples selecção inconsciente, muitas raças são sensìvelmente modificadas no decurso de dois ou três séculos.