Página:Origem das espécies (Lello & Irmão).pdf/55

Wikisource, a biblioteca livre
VARIAÇÃO NO ESTADO DOMÉSTICO
29

tas capacidades naturais são precisas, e quantos anos de prática para se chegar a ser um bom criador de pombos.

Os horticultores seguem os mesmos princípios; mas aqui as variações são muitas vezes repentinas. Ninguém supõe que as nossas mais belas plantas são o resultado de uma única variação da fonte original. Sabemos que tem sido de outra maneira em muitos casos a respeito dos quais possuímos conhecimentos exactos. Assim, pode citar-se como exemplo o aumento sempre crescente da groselha comum. Se compararmos as flores actuais com os desenhos feitos há sòmente vinte ou trinta anos, notam-se os melhoramentos na maior parte dos produtos do floricultor. Quando uma raça de plantas está fixada bastantemente, os horticultores não se dão mais ao trabalho de escolher as melhores plantas, contentam-se em visitar as plantas limites para apartar aquelas que voltaram ao tipo ordinário. Pratica-se também esta espécie de selecção com os animais, porque ninguém é bastante negligente para permitir que os indivíduos defeituosos de um rebanho se reproduzam.

Há ainda um outro meio de observar os efeitos acumulados da selecção nas plantas; basta, com efeito, comparar, num canteiro, a diversidade das flores nas diferentes variedades de uma mesma espécie; numa horta, a diversidade de folhas, de vagens, de tubérculos, ou em geral da parte procurada das plantas hortícolas, relativamente às flores das mesmas variedades; e, enfim, num pomar, a diversidade de frutos de uma mesma espécie, comparativamente às folhas e às flores dessas mesmas árvores. Notai quanto diferem as folhas da Couve, e quanta semelhança na flor; quanto, ao contrário, são diferentes as flores do amor-perfeito, e como as folhas são uniformes; como os frutos das diversas espécies de Groselheira diferem pelo tamanho, pela cor, pela forma e grau de vilosidade, e que pouca diferença nas flores. São apenas as variedades que diferem muito num ponto, não diferindo de resto em todos os outros, porque posso afirmar, após longas e cuidadosas observações, que isto jamais se dá ou quase nunca. A lei da correlação do crescimento, de que não se deve esquecer a importância, arrasta quase sempre algumas diferenças; mas, em regra geral, não se pode duvidar que a selecção contínua de ligeiras variações, quer nas folhas, quer nas flores, quer nos frutos, não produza raças diferentes umas das outras, mais particularmente num dos órgãos.

Poder-se-ia objectar que o princípio da selecção tem sido reduzido à prática apenas há cerca de três quartos de século. Sem dúvida que este assunto, recentemente, tem merecido mais interesse e se têm publicado numerosas obras a seu respeito;