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VARIAÇÃO NO ESTADO DOMÉSTICO
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ornitológicas, a raça de Tolosa e a raça comum, que só diferem pela cor, isto é, pelo mais fugaz de todos os caracteres.

Estas diferentes razões explicam porque nada sabemos, ou quase nada, sobre a origem ou sobre a história das nossas raças domésticas. Mas, com efeito, pode sustentar-se que uma raça, ou um dialecto, tenha uma origem distinta? Um homem conserva e faz reproduzir um indivíduo que apresenta qualquer leve desvio de conformação; ou então dispensa mais cuidados do que faria de ordinário para aparelhar os seus mais belos exemplares; fazendo isto, aperfeiçoa-os, e estes animais aperfeiçoados espalham-se lentamente na vizinhança. Não têm ainda um nome particular; pouco apreciados, a sua história é desprezada. Mas, se continua a seguir este processo lento e gradual, e que, por consequência, estes animais se aperfeiçoam cada vez mais, espalham-se extensamente, e termina-se por os reconhecer como raça distinta tendo algum valor; recebem então um nome, provàvelmente um nome de província. Nos países meio civilizados, onde as comunicações são difíceis, uma nova raça só se espalha muito lentamente. Os principais caracteres da nova raça sendo reconhecidos e apreciados pelo seu justo valor, o princípio da selecção inconsciente, como o tenho chamado, terá sempre por efeito aumentar os traços característicos da raça, quaisquer que possam ser além disso — sem dúvida numa época mais particular que outra, segundo a nova raça é ou não da moda — mais particularmente também num país que noutro, segundo os habitantes são mais ou menos civilizados. Mas, em todo o caso, é muito pouco provável que se conserve a história de mudanças tão lentas e tão insensíveis.

CIRCUNSTÂNCIAS FAVORÁVEIS À SELECÇÃO OPERADA PELO HOMEM

Convém agora indicar, ainda que resumidamente, as circunstâncias que facilitam ou contrariam o exercício da selecção feita pelo homem. Uma grande faculdade de variabilidade é evidentemente favorável, porque fornece todos os materiais sobre que repousa a selecção; todavia, simples diferenças individuais são mais que suficientes para permitir, juntando-lhe ainda muitos cuidados, a acumulação de uma grande soma de modificações em quase todos os sentidos. Contudo, como variações manifestamente úteis ou agradáveis ao homem se produzem apenas acidentalmente, tem-se tanto mais desejo em produzi-las quanto maior é o número de indivíduos que se tratam. O número é,