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membros da nobreza doutoral; e, dentre os doutores, a escolha recai sobre um advogado.

É justo, pois são os advogados ou bacharéis em direito que devem ter obrigação de conhecer a barafunda de leis de toda a natureza, embora a arte de governar, segundo o critério dos que filosofam sobre o Estado e o admitem necessário, não peça unicamente o seco conhecimento de textos de leis, de artigos de códigos, de opiniões de praxistas e hermeneutas.

As leis são o esqueleto das sociedades, mas a feição de saúde ou doença destas, as suas necessidades terapêuticas ou cirúrgicas, são dadas pelo prévio conhecimento e exame, no momento, do estado de certas partes externas e dos seus órgãos vitais, que são o seu comércio, a sua indústria, as suas artes, os sonhos do seu povo, os sofrimentos dele — toda essa parte mutável das comunhões humanas, cambiante e fugidia, que só os fortes observadores, com grande inteligência, colhem em alguns instantes, sugerindo os remédios eficazes e as providências adequadas, para tal ou qual caso.

Como dizia, porém, na Bruzundanga, em geral, o mandachuva é escolhido entre os advogados, mas não julguem que ele venha dos mais notáveis, dos mais ilustrados, não: ele surge e é indicado dentre os mais néscios e os mais medíocres. Quase sempre, é um leguleio da roça que, logo após a formatura, isto é, desde os primeiros anos de sua mocidade até aos quarenta, quando o fizeram deputado provincial, não teve outro ambiente que a sua cidadezinha de cinco a dez mil habitantes, mais outra leitura que a dos jornais e livros comuns