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Gabriella entrou rindo com Jorge para a sala.

— E Mauricio — inquiriu ella — tambem já tem barba para fazer?

— Parece-me que sahiu, ainda com estrellas, para uma partida de caça.

— Bom; esse, pelo que vejo, conserva puros os tradicionaes habitos de familia.

Jorge sorriu.

— Tu é que degeneraste. Deu-me que scismar a novidade. Estou tão costumada a vêr a deterioração progressiva na linha dos representantes das familias que tomam a peito não caldearem o sangue de primeira qualidade que lhes corre nas veias, que ao vêr sahir d'esta velha casa um rapaz de juizo, fiquei espantada.

— É pouco lisongeiro para a nobreza, mas muito lisongeira para mim a sua opinião.

— Digo-t'o com franqueza; e já agora deixa-me aproveitar este tempo, em que estamos sós, para fallar n'isto e assentar as bases do meu proceder. Vamos direitos á questão. As finanças não correm bem cá por casa, ao que entendi.

— Correm muito mal.

— Não admira; é doença da época. E tu tomas a peito endireital-as?

— Tentei-o.

— E conseguel-o. Consegues, porque o teu genio é o de uns certos homens que eu tenho conhecido, que conseguem tudo quanto querem, só a querer e sem fazer barulho. Ai, Jorge, lá por Lisboa ouço dizer que ha tanta falta de financeiros, que estou tentada a exportar-te. E Mauricio?

— Mauricio...

— Percebo; é mais difficil de accommodar esse. Era facil, se não fossem as pieguices de teu pae, que ha de morrer assim. Dize-me uma coisa, ó Jorge, tu és absolutista tambem?

— Eu quasi que não tenho ideias fixas em politica.

— Bom, bom, já entendo. Não queres declarar-te por contemplação para com as tradições de familia. Estás como eu; eu sou, sem duvida alguma, liberal; porque