Página:Os Fidalgos da Casa Mourisca (I e II).pdf/223

Wikisource, a biblioteca livre

esse é o melhor expediente. É preciso que teu pae desafogue a paixão que lá tem dentro. Entende que deve sahir d'aqui, deixemol-o sahir. Estas exterioridades acalmam-n'o. Depois lhe apparecerás.

— Então agora recusa vêr-me?

— Recusa. O que não tira que não possas estar muito á tua vontade na minha casa dos Bacellos. Ha lá um pavilhão na quinta, ao talhar para um refugiado como tu.

Passados poucos minutos os moradores da Casa Mourisca punham-se em movimento para a quinta dos Bacellos.

Os preparativos não occuparam muito tempo, porque o fidalgo mandára apenas levar o que fosse estrictamente necessario.

A baroneza veio despedir-se do tio, que insistiu em querer ser o ultimo a sahir de casa.

Jorge e Mauricio partiram em companhia de Gabriella.

O fidalgo ficou só com frei Januario, que continuava a protestar por todas as fórmas contra a resolução da mudança de quartel a horas improprias.

D. Luiz nem lhe respondia.

Quando o procurador, a fim de suavisar as agruras do desterro, pretendia fazer transportar algum objecto que podia ser de utilidade para melhor accommodação da familia, o fidalgo ordenava-lhe sêcamente que o deixasse ficar, o que cada vez mais exasperava o padre.

Vendo que tudo estava prompto, D. Luiz deixou por alguns instantes o procurador na sala e subiu vagarosamente as escadas que conduziam aos antigos aposentos da filha que perdêra.

Ao penetrar alli, que doloroso estremecer o do coração do velho! Ia desamparar tambem aquelle quarto! Esta ideia só poderia fazer vacillar-lhe a inabalavel coragem! Era um logar de reconhecimento aquelle para o desconfortado ancião. Tudo alli dentro se conservava como no fatal dia em que ella morrêra. Todos os objectos que haviam pertencido á infeliz criança alli se guardavam religiosamente. E ia deixal-os! O leito, o genuflexorio, o toucador, a harpa, parecia possuirem uma voz para fallar-lhe d'ella. E havia de fugir-lhes! A coragem