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XVIII


O antigo solar da familia da baroneza, chamado a Casa dos Bacellos, como que ao despertar de um somno de muitos annos, abrira á luz do dia as suas amplas janellas, reacendêra o fogo nos lares apagados, e restaurára o movimento e a vida nos aposentos vazios.

Era a primeira vez, depois do seu casamento, que a baroneza voltava aos sitios onde lhe corrêra a infancia, cujas suaves memorias ainda os povoavam. Ao vêr de novo aquellas velhas paredes e aquellas arvores frondosas, ao seguir pelos extensos corredores, ao penetrar nas espaçosas salas e nos mais retirados gabinetes da casa, Gabriella, ainda que pouco propensa a melancolias, não pôde subtrahir o espirito a uma impressão de saudade.

Vestigios mal apagados d'aquelle tempo longinquo a cada passo lh'o relembravam; alli fôra o theatro dos seus brinquedos e jogos, além estava um objecto ao qual se prendia a reminiscencia de uma provação infantil, aquelle era o logar favorito de seu pae, acolá desenhava-lhe vagamente a sua recordação a imagem da mãe, que perdêra em criança, e dominada por esta influencia, Gabriella suspirava e conhecia que ainda não morrêra de todo em si o coração provinciano.

Mas uma tal disposição de espirito não podia durar muito. A baroneza era uma mulher de acção, e não se esquecia de que tinha muito em que pensar e que fazer em virtude dos acontecimentos ultimos da Casa Mourisca.