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--Então que queres tu que eu lhe faça? assim nasceu, e assim ha de morrer.

Eis a razão porque a presença de Jorge o surprendeu; mas, sem dar signaes de estranheza, caminhou para elle com as mãos estendidas e o rosto aberto em risos da mais cordial hospitalidade.

--Entre, snr. Jorge, entre. Isto por aqui está tudo uma desordem, mas emfim é casa de lavrador, e em setembro não ha maneira de a ter asseada. Ó Luiza, manda para aqui uma cadeira... ou deixa estar, é melhor entrar lá para dentro.

--Não, Thomé, eu prefiro ficar aqui. E não se incommode. Olhe, já estou sentado.

--Ora! n'um carro! Isso é que não. Nada, não tem geito. Luiza, manda então a cadeira, manda. Quer beber alguma coisa, snr. Jorge?

--Agradecido, Thomé; não tenho sêde. Appeteceu-me vir vêr de perto esta lida, que por aqui vae, e que estive observando, perto de uma hora, alli de cima: por isso desci.

--Ora essa! Pois bem vindo seja, que sempre me dá alegria ver aquelles meninos, que conheci tão pequerruchos como estes.

E apontava para as crianças que, agarradas ás pernas do pae, olhavam com grandes olhos para Jorge.

--São todos seus?--perguntou Jorge, afagando-as e sentando uma nos joelhos.

--E aquelle que a mãe traz ao collo e a pequena que está na cidade.

--Ai, sim, a Bertha. Deve estar uma senhora?

--Está crescidita, está. Mas vamos, tome alguma coisa. Olhe que o meu vinho é puro e não faz mal de qualidade alguma. Aquillo é sumo de uva e nada mais.

--Obrigado, obrigado; mas não bebo agora. Peço-lhe que continue com o seu trabalho, sem se importar commigo. Para isso é que vim.

--Ai, isto está a acabar. Vae no meio dia--acrescentou olhando para o sol--d'aqui a nada vae esta gente jantar e... Para onde levas tu esse carro, ó desalmado? Perdoe-me, snr. Jorge, mas estes diabos... Eu attendo-o já.