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tes do casal, Thomé obrigou Jorge a passar adiante e seguiu-o logo depois.

E de caminho ia-lhe commentando tudo que viam; narrou como alporcára uns pecegueiros, o resultado que tirára do enxoframento das vinhas, a quantidade de fructa que o laranjal lhe produzira, quanto despendêra na construcção do lagar, as difficuldades que encontrou na abertura da nora, o que fizera pouco productiva aquelle anno a cultura do trigo, os cuidados que lhe mereceram os meloaes, e mil outras coisas relativas ao amanho das suas terras, das quaes nem um só palmo se poderia encontrar, onde as plantas nocivas usurpassem o logar das proveitosas.

Jorge escutou-o com uma attenção e interesse, que estavam causando grande estranheza a Thomé, pouco acostumado a vêr as pessoas da categoria de Jorge, e da idade d'elle ainda menos, interrogarem-n'o com tanta curiosidade e ouvirem-n'o com tanta sisudez sobre objectos de lavoura.

E as perguntas do joven fidalgo não eram vagas e ociosas, como essas que por condescendencia se fazem, para lisongear a vaidade natural de um proprietario. Havia n'ellas uma precisão, uma minuciosidade; acompanhavam-n'as reflexões tão acertadas, duvidas tão racionaes, que Thomé não podia illudir-se, e via bem que o descendente dos nobres Negrões de Villar de Corvos o interrogava com desejo de saber.

Esta convicção enthusiasmava Thomé, que proseguia com ardor as suas informações.

Jorge quiz saber aproximadamente o custeio necessario para manter uma propriedade como aquella no ponto de cultura em que estava, e o capital exigido para a elevar a esse grau de florescencia.

Thomé era forte na especialidade dos orçamentos; por isso deu com a melhor vontade a Jorge as informações que este lhe pedia.

A final Jorge, depois de um mais longo intervallo de silencio, que terminou com um suspiro, disse, como a medo, e desviando a cabeça, a fingir-se entretido no exame da roda hydraulica de uma nora: