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OS MAIAS

— Realmente não tem razão. É absurdo... Tudo isto é para seu bem...

Ella teve emfim um movimento, enxugou os olhos, assoou-se doloridamente por entre os seus longos soluços... E de repente, n’um arranque de paixão, atirou-lhe os braços ao pescoço, prendendo-se a elle com desespero, esmagando-o contra o seu seio.

— Oh meu amor, não me deixes, não me deixes! Se tu soubesses! És a unica felicidade que eu tenho na vida... Eu morro, eu mato-me!... Que te fiz eu? Ninguem sabe do nosso amor... E que soubesse! Por ti sacrifico tudo, vida, honra, tudo! tudo!...

Molhava-lhe a face com o resto das suas lagrimas; e elle abandonava-se, sentindo aquelle corpo sem collete, quente e como nú, subir-lhe para os joelhos, collar-se ao seu, n’um furor de o repossuir, com beijos sôfregos, furiosos, que o suffocavam... Subitamente a tipoia parou. E um momento ficaram assim — Carlos immovel, ella cahida sobre elle e arquejando.

Mas a tipoia não continuava. Então Carlos desprendeu um braço, desceu o vidro; e viu que estavam defronte do Ramalhete. O homem, obedecendo á ordem, dera a volta pelo Aterro, devagar, subira a rampa, retrocedera á porta da casa. Durante um instante Carlos teve a tentação de descer, acabar alli bruscamente aquelle longo tormento. Mas pareceu-lhe uma brutalidade.