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OS MAIAS

que é muito rico, comprou expressamente uma quinta nos Olivaes, onde installou a mulher de v. exc.ª, e onde a vai vêr todos os dias, ficando ás vezes, com escandalo da visinhança, até de madrugada. Assim o nome honrado de v. exc.ª anda pelas lamas da capital.» É tudo o que diz a carta; e eu só devo acrescentar, porque o sei, que tudo quanto ella diz é incontestavelmente exacto... O snr. Carlos da Maia é pois publicamente, com conhecimento de toda a Lisboa, o amante d’essa senhora.

Carlos ergueu-se, muito sereno. E abrindo de leve os braços, n’uma aceitação inteira de todas as responsabilidades:

— Não tenho então nada a dizer a v. exc.ª senão que estou ás suas ordens!...

Uma fugitiva onda de sangue avivou a pallidez morena de Castro Gomes. Dobrou a carta, guardou-a com todo o vagar na carteira. Depois, sorrindo friamente:

— Perdão... O snr. Carlos da Maia sabe, tão bem como eu, que se isto tivesse de ter uma solução violenta, eu não viria aqui pessoalmente, a sua casa, lêr-lhe este papel... A coisa é inteiramente outra.

Carlos recahira na cadeira, assombrado. E agora a lentidão adocicada d’aquella voz ia-se-lhe tornando intoleravel. Um confuso terror do que viria d’esses labios, que sorriam com uma pallidez impertinente, quasi fazia estalar o seu pobre coração. E era um