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OS MAIAS

— Ella escrevia-lhe ainda, dizia Carlos, eu sei que ella lhe escrevia...

Sim, Melanie julgava que sim... Mas cartas indifferentes. A senhora levára o seu escrupulo a ponto de que, desde que viera para os Olivaes, nunca mais gastára um ceitil das quantias que lhe mandava o snr. Castro Gomes. As letras para receber dinheiro conservava-as intactas, entregára-lh’as n’essa tarde... Não se lembrava elle de a ter encontrado uma manhã á porta do Monte-Pio? Pois bem! Fôra lá, com uma amiga franceza, empenhar uma pulseira de brilhantes da senhora. A senhora vivia agora das suas joias; tinha já outras no prégo.

Carlos parára, commovido. Mas então para que tinha ella mentido?

— Je ne sais pas, dizia Melanie, je ne sais pas... Mais elle vous aime bien, allez!

Estavam defronte do portão. A tipoia esperava. E, ao fundo da rua d’acacias, a porta da casa aberta deixava passar a luz do corredor, frouxa e triste. Carlos julgou vêr mesmo a figura de Maria Eduarda, embrulhada n’uma capa escura, de chapéo, atravessar n’essa claridade... Ouvira decerto rodar a carruagem. Que afflicta impaciencia seria a sua!

— Vai-lhe dizer que vim, Melanie, vai! murmurou Carlos.

A rapariga correu. E elle, caminhando devagar sob as acacias, sentia no sombrio silencio as pancadas desordenandas do seu coração. Subiu os tres degraus de pedra — que lhe pareciam já d’uma