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OS MAIAS
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de ceias na Maison d’Or ficavam sem resposta: outras traziam, embrulhada n’um bocado de papel, alguma meia-libra que tinha o pavoroso sabor d’uma esmola. Uma noite, um sabbado de grande nevoeiro, indo empenhar um chambre de rendas da mamã, perdera-se, errára na vasta Londres n’uma treva amarellada, a tiritar de frio, quasi com fome, perseguida por dois brutos que empestavam a alcool. Para lhes fugir atirou-se para dentro d’um cab que a levou a casa. Mas não tinha um penny para pagar ao cocheiro; e a patrôa roncava no seu cacifro, bebeda. O homem resmungou; ella, succumbida, alli mesmo na porta rompeu a chorar. Então o cocheiro desceu da almofada, commovido, offereceu-se para a levar de graça ao prégo, onde ajustariam as suas contas. Foi; o pobre homem só aceitou um schilling; até mesmo suppondo-a franceza grunhiu blasphemias contra os prussianos, e teimou em lhe offerecer uma bebida.

Ella no emtanto procurava uma occupação qualquer — costura, bordados, traducções, cópias de manuscriptos... Não achava nada. N’aquelle duro inverno o trabalho escasseava em Londres; surgira uma multidão de francezes, pobres como ella, luctando pelo pão... A mamã não cessava de chorar; e havia alguma coisa mais terrivel que as suas lagrimas — eram as suas allusões constantes á facilidade de se ter em Londres dinheiro, conforto e luxo, quando se é nova e se é bonita...