Página:Os Maias - Volume 2.pdf/257

Wikisource, a biblioteca livre
OS MAIAS
247

Ega raspava phosphoros na sola para accender o charuto. E resmungava:

— Sim, o velho Affonso é granitico...

Por isso Carlos concebera outro plano, mais sagaz: consistia em esconder ao avô o passado de Maria — e fazer-lhe conhecer a pessoa de Maria. Casavam secretamente em Italia. Regressavam: ella para a rua de S. Francisco, elle filialmente para o Ramalhete. Depois Carlos levava o avô a casa da sua boa amiga, que conhecera em Italia, M.me de Mac-Gren. Para o prender logo lá estavam os encantos de Maria, todas as graças d’um interior delicado e sério, jantarinhos perfeitos, idéas justas, Chopin, Beethoven, etc. E, para completar a conquista de quem tão enternecidamente adorava crianças, lá estava Rosa... Emfim, quando o avô estivesse namorado de Maria, da pequena, de tudo — elle, uma manhã, dizia-lhe francamente: «Esta creatura superior e adoravel teve uma quéda no seu passado; mas eu casei com ella; e, sendo tal como é, não fiz bem, apesar de tudo, em a escolher para minha esposa?» E o avô, perante esta terrivel irremediabilidade do facto consummado, com toda a sua indulgencia de velho enternecido a defender Maria — seria o primeiro a pensar que, se esse casamento não era o melhor segundo as regras do mundo, era decerto o melhor segundo os interesses do coração...

— Pois não te parece, Ega?

Ega, absorvido, sacudia a cinza do charuto. E