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OS MAIAS
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Carlos que trespassava o Ega, com os olhos inquietos, querendo adivinhar o motivo d’aquella brusca chegada aos Olivaes.

Quando entrou para a caleche, tendo pago o batedor, Ega, embaraçado, sem poder desabafar diante de Maria sobre o caso da Corneta, começou, sob os olhos de Carlos que o não deixavam, a fallar do inverno, das inundações do Riba-Tejo... Maria lêra. Uma desgraça, duas crianças afogadas nos berços, gados perdidos, uma grande miseria! Por fim Carlos não se conteve:

— Eu lá recebi a tua carta...

Ega acudiu:

— Arranja-se tudo! Está tudo combinado! E com effeito eu não vim senão por um sentimento bucolico...

Muito discretamente Maria olhára para o rio. Ega fez então um gesto rapido com os dedos significando «dinheiro, só questão de dinheiro». Carlos socegou: e Ega voltou a fallar dos inundados do Riba-Tejo e do sarau litterario e artistico que em beneficio d’elles se «ia commetter» no salão da Trindade... Era uma vasta solemnidade official. Tenores do parlamento, rouxinoes da litteratura, pianistas ornados com o habito de S. Thiago, todo o pessoal canoro e sentimental do constitucionalismo ia entrar em fogo. Os reis assistiam, já se teciam grinaldas de camelias para pendurar na sala. Elle, apesar de demagogo, fôra convidado para lêr um episodio das Memorias d’um Atomo: recusára-se,