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OS MAIAS

por modestia, por não encontrar nas Memorias nada tão sufficientemente palerma que agradasse á capital. Mas lembrára o Cruges; e o maestro ia ribombar ou arrulhar uma das suas Meditações. Além d’isso havia uma poesia social pelo Alencar. Emfim, tudo prenunciava uma immensa orgia...

— E a snr.ª D. Maria, acrescentou elle, devia ir!... É summamente pittoresco. Tinha v. exc.ª occasião de vêr todo o Portugal romantico e liberal, à la besogne, engravatado de branco, dando tudo que tem n’alma!

— Com effeito devias ir, disse Carlos, rindo. Demais a mais se o Cruges toca, se o Alencar recita, é uma festa nossa...

— Pois está claro! gritou Ega, procurando o monoculo, já excitado. Ha duas coisas que é necessario vêr em Lisboa... Uma procissão do Senhor dos Passos e um sarau poetico!

Rolavam então pelo largo do Pelourinho. Carlos gritou ao cocheiro que parasse no começo da rua do Alecrim: elles apeavam-se e tomavam de lá o americano para o Ramalhete.

Mas a tipoia estacou antes da calçada, rente ao passeio, em frente d’uma loja de alfaiate. E n’esse instante achava-se ahi parado, calçando as suas luvas pretas, um velho alto, de longas barbas d’apostolo, todo vestido de luto. Ao vêr Maria, que se inclinára á portinhola, o homem pareceu assombrado; depois, com uma leve côr na face larga e pallida, tirou gravemente o chapéo, um