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OS MAIAS

— Detesto isso! rosnou Carlos.

Maria tambem achava intoleravel um sujeito a chilrear, sem idéas, como um passaro n’um galho d’arvore...

— É conforme a occasião, observou Ega, olhando o relogio. Uma walsa de Strauss tambem não tem idéas, e á noite, com mulheres n’uma sala, é deliciosa...

Não, não! Maria entendia que essa rhetorica amesquinhava sempre a palavra humana, que, pela sua natureza mesma, só póde servir para dar fórma ás idéas. A musica, essa, falla aos nervos. Se se cantar uma marcha a uma criança, ella ri-se e salta no collo...

— E se lhe lêres uma pagina de Michelet, concluiu Carlos, o anjinho secca-se e berra!

— Sim, talvez, considerou o Ega. Tudo isso depende da latitude e dos costumes que ella cria. Não ha inglez, por mais culto e espiritualista, que não tenha um fraco pela força, pelos athletas, pelo sport, pelos musculos de ferro. E nós, os meridionaes, por mais criticos, gostamos do palavriadinho mavioso. Eu cá pelo menos, á noite, com mulheres, luzes, um piano e gente de casaca, pello-me por um bocado de rhetorica.

E, com o appetite assim desperto, ergueu-se logo para enfiar o paletot, voar á Trindade, n’um receio de perder o Rufino.

Carlos deteve-o ainda, com uma grande idéa:

— Espera. Descobri melhor, fazemos o sarau