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OS MAIAS
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elles um parentesco chegado. Tudo isto atrapalhado, curto, «á pressa». Por fim n’outra carta deixava escapar toda a verdade, mandava-lhe a declaração da mãe; e mostrando a necessidade d’uma separação, emquanto se não esclarecessem todas as duvidas, pedia-lhe que partisse para Paris. Villaça ficava encarregado da questão de dinheiro, entregando-lhe logo para a viagem trezentas ou quatrocentas libras... Ah! tudo isto era bem complicado, bem covarde! Mas só havia esse meio. E quem, senão elle, o podia tentar com caridade e com tacto?

E, entre o tumulto d’estes pensamentos, de repente achou-se na travessa da Parreirinha, defronte da casa de Maria. Na sala, através das cortinas, transparecia uma luz dormente. Todo o resto estava apagado — a janella do gabinete estreito onde ella se vestia, a varanda do quarto d’ella com os vasos de chrysantemos.

E pouco a pouco aquella fachada muda d’onde apenas sahia, a um canto, uma claridade languida d’alcova adormecida, foi-o estranhamente penetrando de inquietação e desconfiança. Era um medo d’essa penumbra molle que sentia lá dentro, toda cheia de calor e do perfume em que havia jasmim. Não entrou; seguiu devagar pelo passeio fronteiro, pensando em certos detalhes da casa — o sofá largo e profundo com almofadas de sêda, as rendas do toucador, o cortinado branco da cama d’ella... Depois parou diante da larga barra