Página:Os Maias - Volume 2.pdf/455

Wikisource, a biblioteca livre
OS MAIAS
445

que a senhora, um pouco cansada, se fôra encostar sobre a roupa; — e a sala, com effeito, parecia abandonada por essa noite, com as serpentinas apagadas, o bordado ocioso e enrolado no seu cesto, os livros n’um frio arranjo orlando a mesa onde o candieiro espalhava uma luz tenue sob o abat-jour de renda amarella.

Carlos tirava as luvas, lentamente, retomado de novo por uma inquietação ante aquelle recolhimento adormecido. E de repente Rosa correu de dentro, rindo, pulando, com os cabellos soltos nos hombros, os braços abertos para elle. Carlos levantou-a ao ar, dizendo como costumava: «Lá vem a cabrita!...»

Mas então, quando a tinha assim suspensa, batendo os pésinhos — atravessou-o a idéa de que aquella criança era sua sobrinha e tinha o seu nome!... Largou-a, quasi a deixou cahir — assombrado para ella, como se pela vez primeira visse essa facesinha eburnea e fina onde corria o seu sangue...

— Que estás tu a olhar para mim? murmurou ella, recuando e sorrindo, com as mãosinhas cruzadas atraz das saias que tufavam.

Elle não sabia, parecia-lhe outra Rosa: e á sua perturbação misturava-se uma saudade pela antiga Rosa, a outra, a que era filha de Madame Mac-Gren, a quem elle contava historias de Joanna d’Arc, a quem balouçava na Toca sob as acacias em flôr. Ella no emtanto sorria mais, com um brilho