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OS MAIAS

um inutil, nem cantava sequer como o seu chefe as balladas da Filandia; cahido no fundo d’uma poltrona, de casaca, de vidro no olho, bamboleando a perna, cofiava silenciosamente os seus longos bigodes tristes.

O amigo que Carlos gostava de vêr entrar era o Cruges — que vinha da rua de S. Francisco, trazia alguma coisa do ar que Maria Eduarda respirava. O maestro sabia que Carlos ia todas as manhãs ao predio vêr a «miss ingleza»; e muitas vezes, innocentemente, ignorando o interesse de coração com que Carlos o escutava, dava-lhe as ultimas noticias da visinha...

— A visinha lá ficou agora a tocar Mendelhson... Tem execução, tem expressão, a visinha... Ha alli estofo... E entende o seu Choppin.

Se elle não apparecia no Ramalhete, Carlos ia a casa buscal-o: entravam no Gremio, fumavam um charuto n’alguma sala isolada, fallando da visinha; Cruges achava-lhe «um verdadeiro typo de grande dame».

Quasi sempre encontravam o conde de Gouvarinho, que vinha ver (como elle dizia a faiscar d’ironia) o que se passava «no paiz do snr. Gambetta». Parecera remoçar ultimamente, mais ligeiro nos modos, com uma claridade d’esperança nas lunetas, na fronte erguida. Carlos perguntava-lhe pela condessa. Lá estava no Porto, nos seus deveres de filha...