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OS MAIAS

brusco de toda essa mocidade estouvada. A Lucy Gray, morta. A Conrad, morta... E a Maria Blond? Gorda, emburguezada, casada com um fabricante de velas de estearina. O polaco, o louro? Fugido, desapparecido. Mr. de Menant, esse D. Juan? Sub-prefeito no departamento do Doubs. E o rapaz que morava ao lado, o belga? Arruinado na Bolsa... E outros ainda, mortos, sumidos, afundados no lodo de Paris!

— Pois tudo sommado, menino, observou Ega, esta nossa vidinha de Lisboa, simples, pacata, corredia, é infinitamente preferivel.

Estavam no Loreto; e Carlos parára, olhando, reentrando na intimidade d’aquelle velho coração da capital. Nada mudára. A mesma sentinella somnolenta rondava em torno á estatua triste de Camões. Os mesmos reposteiros vermelhos, com brazões ecclesiasticos, pendiam nas portas das duas igrejas. O Hotel Alliance conservava o mesmo ar mudo e deserto. Um lindo sol dourava o lagedo; batedores de chapéo á faia fustigavam as pilecas; tres varinas, de canastra á cabeça, meneavam os quadris, fortes e ageis na plena luz. A uma esquina, vadios em farrapos fumavam; e na esquina defronte, na Havaneza, fumavam tambem outros vadios, de sobrecasaca, politicando.

— Isto é horrivel quando se vem de fóra! exclamou Carlos. Não é a cidade, é a gente. Uma gente feiissima, encardida, mollenga, reles, amarellada, acabrunhada!...