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OS MAIAS
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que nem Carlos nem Ega conheciam, gorda e vestida d’escarlate; e de pé, conversando baixo com o conde, de mãos atraz das costas, um cavalheiro alto, escaveirado, grave, com uma barba rala, e a commenda da Conceição.

A condessa, um pouco córada, estendeu a Carlos a mão amuada e frouxa: todos os seus sorrisos foram para o Ega. E o conde apoderou-se logo do querido Maia, para o apresentar ao seu amigo o snr. Sousa Netto. O snr. Sousa Netto já tinha o prazer de conhecer muito Carlos da Maia, como um medico distincto, uma honra da Universidade... E era esta a vantagem de Lisboa, disse logo o conde, o conhecerem-se todos de reputação, o poder-se ter assim uma apreciação mais justa dos caracteres. Em Paris, por exemplo, era impossivel; por isso havia tanta immoralidade, tanta relaxação...

— Nunca sabe a gente quem mette em casa.

O Ega, entre a condessa e D. Maria, enterrado no divan, mostrando as estrellinhas bordadas das meias, fazia-as rir com a historia do seu exilio em Celorico, onde se distrahia compondo sermões para o abbade: o abbade recitava-os; e os sermões, sob uma fórma mystica, eram de facto affirmações revolucionarias que o santo varão lançava com fervor, esmurrando o pulpito... A senhora de vermelho, sentada defronte, de mãos no regaço, escutava o Ega, com o olhar espantado.

— Imaginei que v. exc.ª tinha ido já para Cintra,