impostor. O verme resvala como o dragão e como elle retesa-se e levanta-se. O traidor não é mais que um despota tolhido que não póde fazer a sua vontade senão resignando-se ao segundo papel. É a mesquinhez capaz da enormidade. O hypocrita é um titão-anão.
Clubin imaginava de boa fé que tinha sido opprimido. Porque razão não nascèra rico? O que elle queria era que os paes lhe houvessem deixado cem mil libras de renda. Por que não as tinha? Não era culpa delle. Porque motivo, não lhe dando todos os gosos da vida, forçaram-n’o a trabalhar, isto é, a enganar, a trahir, a destruir? Porque motivo condemnaram-n’o assim a essa tortura de adular, de rastejar, de comprazer, de fazer-se amar e respeitar, e trazer dia e noite no rosto um rosto que não ere delle? Dissimular é uma violencia imposta. Odeia-se diante de quem se mente. Soára emfim a hora. Clubin vingava-se.
De quem? De todos e de tudo.
Lethierry não lhe fez senão bem: queixa de mais; vingava-se de Lethierry.
Vingava-se de todos aquelles ante quem foi obrigado a constranger-se. Desforrava-se. Quem quer que pensasse bem delle, era seu inimigo, porque elle foi captivo desse homem.
Clubin achava-se livre. Realisára-se a fuga. Estava fóra dos homens. O que se tinha por morte, era vida; elle ia começar agora. O verdadeiro Clubin despojava-se do falso Clubin. De um lance dissolveu tudo. Empurrou com o pé, Rantaine ao espaço, Lethierry á ruina, a justiça humana ás trevas, a opinião ao erro, a humanidade inteira para longe de si. Tinha eliminado o mundo.