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Página:Os trabalhadores do mar.djvu/666

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harmonia diffusa. O que começava a despontar procurava o que começava a surdir. Uma turvação, que surgia debaixo, e vertia tambem de cima, agitava vagamente os corações, corruptiveis á influencia espessa e subterranea dos germens. A flôr promettia obscuramente o fructo, todas as virgens scismavam, a reproducção dos seres, premeditada pela immensa alma da sombra, esboçava-se na irradiação das cousas. Era o universal noivado. A vida, que é a esposa, abraçava o infinito, que é o esposo. O dia estava claro, formoso, e ardente; atravez das sebes, nas cercas, viam-se rir as crianças Algumas jogavam a palheta. As macieiras, os pecegueiros, as cerejeiras, as pereiras, cobriam os vergeis com os seus grossos tuffos pallidos ou vermelhos. Na relva, as primaveras, as pervincas, as mil-folhas, as margaridas, os amaryles, os jacinthos, as violetas e as veronicas. As borragens azues, os iris amarellos, pululavam, com as bollas estrellinhas côr de rosa que florecem sempre aos bandos e que por esse motivo chamam-se as companheiras. Animaculos dourados corriam por entre as pedras. O sayão florescente purpureava os tectos das cabanas. As operarias das colmeas andavam por fóra. A abelha trabalhava. A extensão estava cheia do murmurio dos mares e do zumbido das moscas. A natureza, permeavel na primavera, estava humida de voluptuosidade.

Quando Gilliatt chegou a Saint-Sampson, ainda a maré não enchera e elle pôde atravessar a praia a pé secco, desapercebido por traz dos cascos de navios no estaleiro. Um cordão de pedras chatas, postas de espaço a espaço, auxiliava a passagem.