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OCCIDENTAES

      Onde os raios da lampada cahiam
         Onde as tranças angelicaes
De outra cabeça outr’ora alli se desparziam,
         E agora não se esparzem mais.

         Suppuz então que o ar, mais denso,
         Todo se enchia de um incenso,
Obra de seraphins que, pelo chão roçando
         Do quarto, estavam meneando
      Um ligeiro thuribulo invisivel;
      E eu exclamei então: «Um Deus sensivel
      «Manda repouso á dor que te devora
         «D’estas saudades immortaes.
«Eia, esquece, eia, olvida essa extincta Lenora.»
         E o corvo disse: «Nunca mais.»

         «Propheta, ou o que quer que sejas!
         «Ave ou demonio que negrejas!
«Propheta sempre, escuta: Ou venhas tu do inferno
         «Onde reside o mal eterno,
      «Ou simplesmente naufrago escapado
      «Venhas do temporal que te ha lançado
      «N’esta casa onde o Horror, o Horror profundo
         «Tem os seus lares triumphaes,
«Dize-me: existe acaso um balsamo no mundo?»
         E o corvo disse: «Nunca mais.»

         «Propheta, ou o que quer que sejas!
         «Ave ou demonio que negrejas!
«Propheta sempre, escuta, attende, escuta, attende!
         «Por esse céu que alem se estende,