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se tem por seu que é traslado do antigo copiado pelo doutor João de Aregas, valido e chançarel-mor delrei D. João I.» Estevão Paulinio, editor do Nobiliario preparado por Lavanha, diz na Advertencia preliminar posta á frente da edição de 1640: «El Libro antiguo, o Nobiliario antiguo, de quien se sacaron las notas que van al margen deste, es uno, que estes años estava en poder de D. Miguel de Castro, que murio obispo de Viseu, y le huvo de Miguel Gudiño de Castelbranco, hijo del que puso en limpio los más de los libros del Archivo Real de Lisboa, que está en la Torre do Tombo; que pudo ser le sacase de alli como cosa que ya no servia, estando incorporado en el del conde, que quedo en el Archivo.»

Temos pois um codice antigo, tirado da Torre ainda no seculo XVI, e possuído successivamente pelo bispo D. Miguel de Castro, e pelo marquez de Castel-Rodrigo, se é que o do marquez não era um codice diverso da mesma obra, ou até uma simples copia do primeiro.

Mas o Nobiliario de que se extrahiram as notas de Lavanha não é senão o Livro Velho, como poderá verificar quem fizer o cotejo deste com as passagens citadas á margem das planas do Nobiliario impresso em Roma em 1640.

Assim fica explicado o mysterio em que se involveu Lousada copiando o antigo codice. Sabia que era um documento do Archivo publico que andava distrahido, mas que estava em mão de pessoas poderosas. Limitou-se a dizer vagamente que estivera na Torre e d'alli desapparecêra, sollicitando depois em geral uma carta de excomunhão contra os detentores de documentos publicos, e procurando por esse meio indirecto a restituição do codice.

Sousa, entendendo ás avessas o prologo de Lavanha, e esquecendo-se de cotejar as citações á margem das Planas do Nobiliario de Roma com o proprio Livro Velho que publicou, não fez senão confundir-se a si e aos seus leitores, desarrazoando miseravelmente a este propósito[1]. Faria e Sousa, cuja auctoridade seria maior, como vivendo naquella epocha e escrevendo sobre o assumpto, se não fosse a leveza ordinaria dos seus juizos, e a certeza que attribuia a qualquer cousa que se lhe antolhava, affirma que no seu tempo nenhum outro nobiliario remoto havia senão o do conde D. Pedro e o chamado Livro Antigo, que era mais propriamente o do conde[2]; que todos os outros eram modernos, vindo a ser o mais antigo o de Damião de Goes, anterior apenas oitenta annos, e os restantes de escriptores contemporaneos delle Faria e Sousa.

Eis o que hoje se póde saber sobre a authenticidade do Livro Velho, cuja indole, fórma e estylo seriam sobejos fiadores da sua legitimidade, na falta de um codice antigo, se não houvera passado pelas mãos de Lousada, ou se nos restasse uma copia que com certeza soubessemos não ser transumpto da que tirou esse homem costumado a inventar documentos em abono dos seus ou de alheios embustes.

Para a presente edição servimo-nos até onde nos foi possivel do unico manuscripto que parece restar do Livro Velho anterior á sua publicação nas Provas da Historia Genealogica. Todas as diligencias que se fizeram em Lisboa e nas provincias para achar outra copia de que nos valessemos na correcção do texto impresso, foram baldadas. O unico que existe é infelizmente um fragmento que não abrange todo o N.° I, o qual pertence á Bibliotheca Real. A letra parece do principio do seculo XVII, e o texto é obviamente mais correcto que o de Sousa, posto que o copista não pareça ter sido escrupuloso em conservar a ortographia antiga. Seguimo-lo até onde elle abrange, indicando as variantes dos dous manuscriptos de que o auctor da Historia Genealogica se serviu, e designando o de Affonso de Torres que constitue o texto da edição de Sousa com a letra S, e o que pertenceu aos carmelitas descalços cujas variantes este indicou á margem, com a letra C. Das variantes entre o nosso manuscripto e a edição da Historia Genealogica desprezámos as que nenhuma importancia tinham, como Pires por Peres, Pay por Payo, Soer por Soeiro, Mor por Mayor etc. Desprezámos igualmente as que só procedem de saltos de palavras e de obvios e grosseiros erros typographicos, de que poucos livros serão

  1. Hist. Genealog. T. I, p. 278.
  2. Notas finaes ao Nobiliario, por Montebello, Vera e Faria e Sousa, p. 44. Esta opinião de que o Livro Velho é o original do conde seguiram-no outros escriptores, mas são apenas conjecturas que não se estribam em prova alguma.