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chamar ínstincto diplomatico, — exige a discrição cuidado em não comprometter terceiro. Leviandade, por exemplo, em allegar a fonte d'onde obtivemos aquillo que communicamos a outrem, abala a confiança d'este; e grangeando as devidas graças, somos tidos todavia por indiscretos. Isto, quanto à palavra.

Por escripto, pede-se ainda maior cautela n'este particular. Na sua carta ao Cardeal de Richelieu, sob data de 26 de agosto de 1639, participou-lhe o Conde d'Estrades que o Principe de Orange tivera aviso confirmatorio da noticia que, por via d'elle Estrades, lhe mandara o Cardeal (a respeito da esquadra que os Hespanhoes então apparelhavam), aviso que lhe fora expedido «pelo primeiro official da Secretaria do Governador Geral, o qual o dito Principe tinha subornado com valiosos presentes, e que lhe communicava todas as particularidades dos desígnios hespanhoes[1]

D'Estrades era um habilissimo diplomata; mas não vemos que tivesse necessidade de indicar com tanta clareza o individuo que, trahindo os seus deveres, era de tão grande proveito ao Principe e aos seus alliados; com risco de, no caso de extravio da carta, não só comprometter aquelle, senão tambem o serviço a que se prestara.

Além d'isso, ha hoje outro motivo para que se observe a devida prudencia e discrição, o qual não existia outr'ora, a saber, a publicidade, propria do regimen representativo.

Antigamente os embaixadores e enviados, a fóra a sua correspondencia com o Secretario d'Estado, dirigiam-se tambem directamente ao Soberano; pelo que podiam sem duvida manifestar com mais afouteza o seu pensamento e o

fundo dos segredos, na certeza de que as suas communica-

  1. Letters and Negotiations of Count d’Estrades — London, 1755; pag. 27.