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quem acceita boatos levemente, nenhum escrupulo tem em lhes accrescentar um ponto; e acerca d'esta lei da natureza humana, cita palavras de Tacito: Fingunt simul creduntque[1].

Escusado é dizer que a sinceridade é compativel não só com a reserva, senão tambem com a disciplina do genio e do caracter. De outra forma fôra a simpleza do irracional, que obedece cegamente ao instincto. Nos dias tristes e soturnos emmudecem os passaros, em quanto que as baleas, de contentes, sobem á superficie do oceano; as aranhas annunciam a chuva, escondendo-se; e as sanguesugas, vindo à tona d'agoa. O homem pelo contrario deve saber domar os instinctos, obedecendo á rasão; reprimir, quando convier, manifestações embora innocentes, afeiçoando-se, e amoldando-se às circumstancias, e às condições exigidas pela posição que occupa. Da sinceridade não destoam os esforços que fizessemos para emendar defeitos, ou aplanar exuberancias do temperamento, afim de equilibrar o humor, moderar a evidencia das commoções internas, manter a impassibilidade quando a occasião o pedisse, adquirir, em summa, o possivel domínio sobre nós, e nunca perder a paciencia, uma das qualidades mais invejaveis no Diplomata. Sir Francis Walsingham tinha-a em tão subido grau que um seu criado de camera, asseverava que nunca o tinha visto irado; ao passo que na Côrte tambem nunca o viram perturbado. É lição do nosso Francisco de Moraes que

«quem de alguma (cousa) se espanta, de pouca experiencia

  1. «Infensa Lugdunensis colonia... fecunda rumoribus. Sed plurima ad fingendum credendumque materies in ipsis castris, odio, metu,» etc., Tacit. Hist., L. I c. 51.