Página:Quincas Borba.pdf/229

Wikisource, a biblioteca livre
QUINCAS BORBA
219

QUINCAS BORBA

219

— Infernal carta! rosnou surdamente, repetindo uma phrase ouvida no theatro, algumas semanas antes; phrase esquecida, que, por uma associação dft idéias, vinha agora exprimir a analogia moral do expectaculo e do expectador. Teve Ímpetos de abril-a; era só um gesto, um acto; ninguém o via, os quadros da parede estavam quietos, indiferentes, o turco do tapete continuava a fumar e a olhar para o Bosphoro. Contudo, sentia escrúpulos; a carta, posto que achada no jardim, não lhe pertencia, mas ao outro. Era como se fosse um embrulho de dinheiro; não devolveria o dinheiro ao dono? Despeitado, metteu-a outra vez no bolso. Entre mandar a carta ao destinatário e entregal-a a Sophia, adoptou afinal o segundo alvitre; tinha a vantagem de poder lêr a verdade nas feições da própria autora. — Digo-lhe que achei uma carta, assim e assim, pensou Bubião; e antes de lhe dar a carta, vejo bem na cara delia, se fica atterrada ou não. Talvez empallideça: então ameaço-a, fallo-lhe da rua da Harmonia; juro-lhe que estou disposto a gastar trezentos, oitocentos, mil contos, dous mil, trinta mil contos, se tanto fôr preciso para estrangular o infame...