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«Meu caro senhor e amigo,

«Você ha de ter estranhado o meu silencio. Não lhe tenho escripto por certos motivos particulares, etc. Voltarei breve; mas quero communicar-lhe desde já um negocio reservado, reservadissimo.

«Quem sou eu, Rubião? Sou Santo Agostinho. Sei que ha de sorrir, porque você é um ignaro, Rubião; a nossa intimidade permittia-me dizer palavra mais crua, mas faço-lhe esta concessão, que é a ultima. Ignaro!

«Ouça, ignaro. Sou Santo Agostinho; descobri isto ante hontem; ouça e cale-se. Tudo coincide nas nossas vidas. O santo e eu passámos uma parte do tempo nos deleites e na heresia, porque eu considero heresia tudo o que não é a minha doutrina de Humanitas; ambos furtámos, elle, em pequeno, umas peras de Carthago, eu, já rapaz, um relogio do meu amigo Braz Cubas. Nossas mães eram religiosas e castas. Emfim, elle pensava, como eu, que tudo que existe é bom, e assim o demonstra no cap. xvi, livro vii das Confissões, com a differença que para elle, o mal é um desvio da vontade, illusão propria de um seculo atrazado, concessão ao erro, pois que o mal nem mesmo existe, e só a primeira affirmação é