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QUINCAS BORBA

noite, recompondo os olhares de Sophia e de Rubião.

Chegaram a casa na rua do Senado; o pae foi dormir, a filha não se deitou logo, deixou-se estar em uma cadeirinha, ao pé da commoda, onde tinha uma imagem da Virgem. Não trazia ideias de paz nem de candura. Sem conhecer o amor, tinha noticia do adulterio, e a pessoa de Sophia pareceu-lhe hedionda. Via nella agora um monstro, metade gente, metade cobra, e sentiu que a aborrecia, que era capaz de vingar-se exemplarmente, de dizer tudo ao marido.

— Conto-lhe tudo, — ia pensando — ou de viva voz, ou por uma carta... Carta não; digo-lhe tudo um dia, em particular.

E imaginando o colloquio, antevia o espanto do homem, depois o agastamento, depois os impropérios, as palavras duras que elle havia de dizer á mulher, miserável, indigna, vil... Todos esses nomes soavam bem aos ouvidos do seu desejo; ella fazia derivar por elles a própria colera; fartava-se de a rebaixar assim, de a pôr debaixo dos pés do marido, já que o não podia fazer por si mesma... Vil, indigna, miseravel...

Durou muito tempo essa explosão de raiva interior, — perto de vinte minutos; mas a alma cançou, e tornou a si. A imaginação não podia mais, e a