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POLLICE VERSO

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tira do olhar e a hypocrisia da bocca. Assim entrincheiradas, ellas, já de si immateriaes, ficam inexpugnaveis á argucia alheia. E vae nisso a pouca de felicidade existente neste mundo sub-lunar. Fosse possivel ler nos cerebros, claro como se lê no papel, e a humanidade crispar-se-ia de horror ante si propria...

Positivo como era o Ignacinho, suppomos que metteu em equação o problema das duas vidas.

1.a hypothese.

Cura do Major — 3 contos

3 contos — Itaóca, pasmaceira, etc...

2.a hypothese

Morte do Major — 30 contos

30 contos — Paris, Yvonne, Bois...

Depois desta solida mathematica, esta anavalhante philosophia: A morte é um preconceito. Não ha morte. Tudo é vida. Morrer é a transição de um estado para outro. Quem morre, transforma-se. Continua a viver inorganicamente, transmutado em gazes e saes, ou organicamente, feito Lucilias, Necrophoras e uma centena de outras vidinhas esvoaçantes. Que importa para a harmonia universal das coisas esta ou aquella forma? Tudo é vida. Tudo mata para viver. A grande questão é poder matar!... Eu preciso e quero viver a minha vida. Ha obices no caminho? Afasto-os! Tão simples...

Fiquemos por aqui. Estes soliloquios mentaes são apavorantes quando descarnados da abençoada polpa da hypocrisia.

Hypocrisia! que cascão precioso és tu! e como te injuriam... os hypocritas!...

Fiquemos por aqui.

Não ha tempo para malbaratar com o amoralismo, porque o Major Mendanha peiorou subitamente e lá agonisa. Morreu. O attestado d'obito baptisou a causa-mortis de phlegmatite aguda com nephrite elipsoidal. Podia baptisal-a de embolia estourada, nó cego na tripa, tuberculose mesenterica, estupor granuloso peristaltico, ou qualquer outro dos cem mil modos de morrer á grega. Morreu, e está dito tudo.