Página:Revista do Brasil, 1917, anno II, v V, n 17.pdf/483

Wikisource, a biblioteca livre

CAVALLERIA RUSTICANA

— Navio?

— Talvez pharol ...

Dave azo á duvida uma luzita vermelha a piscar no horizonte, unica na escuridão da noite. Escuridão, não direi de breu, que não é o breu de sobejo escuro para referir um negror d'aquelles. De cego de nascença, vá.

Ceu e mar fundia-os um só carvão, sem fresta nem pique além da pinta vermelha, que ás subitas se fez amarella.

— Lá mudou de côr, é pharol.

E como era pharol a conversa cahiu sobre pharoes. Eduardo interpellou-me de chofre sobre a ideia que eu delles fazia.

— A ideia de toda a gente, ora esea!

— Quer dizer uma ideia falsa. "Toda a gente" é um monstro com orelhas d'asno e miolos de macaco, incapaz d'uma ideia sensata sobre o que quer que é. Tens na cabeça. respeito a pharol, uma ideia de rua, moeda corrente recebida do vulgo e nunca recunhada na matriz d'uma impressão pessoal. Erro?

— Confesso-té que eu seria capaz de estarrecer um auditorio de casaca, conferenciando sobre esse thema; não affirmo, entretanto, que o pharol descripto se parecesse com algum.

— Pois affirmo-te eu. sem menospreço do teu engenho, que tal conferencia, ouvida por um pharoleiro, poria o homem de olho parvo a dizer como o outro: se percebo, cebo!

— Acredito. E entenderia elle melhor a tua sécca?

— E' de crer. Já vivi uma temporada inesquecível no pharol dos Albatrozes, e falaria de cadeira.

— Já viveste em pharol! Homem prodigioso que és!...

— E lá fui comparsa n'uma tragedia nocturna de arripiar cabellos. O escuro desta noite evoca-me o tremendo drama...

Estavamos ambos de bruços na amurada do Orion, e a hora propiciava o esbagoar d'um dramalhão inedito. Esporeado na curiosidade, provoquei-o: