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REVISTA DO BRASIL
XVI

Propheta ou Satanaz, negro ser da desgraça,
Propheta senmpre atroz de negra prophecia,
Pelo azul deste céo que sobre nós se espaça,
Pelo Deus, todo luz, que em ambos nós radia,

Dize a esta alma sem luz e de duvidas baça,
Baça de incertidão e de melancholia:
Ser-lhe-ha dado abraçar o anjo que entre anjos passa,
E' de cujo esplendor hoje o céo se atavia?

Ser-lhe-ha dado abraçar a virgem pura e santa,
Virgem casta e piedosa e que os anjos encanta
Com seus gestos de encanto e encantos virginaes?

Ser-lhe-ha dado abraçar, oh! dize-o sem demora,
A rútila, a radiosa, a radiante Eleonora?
E o corvo, inda outra vez, repetiu: Nunca mais!

XVII

"Que esta palavra, emfim! de negra prophecia
Do teu regresso o inicio ambicionado seja.
Regressa ao reino teu, á noite que te envia,
A' noite plutoneana, essa que em ti negreja!

Volve! Cala essa voz que me fére e angustia!
Reentra no temporal, volve á tua peleja
De lá fóra, e não fique uma só pluma esguia
Neste chão, de tua vil plumagem malfazeja!

Não quero que de ti uma reminiscencia
Fique nesta de dôr, sagrada residencia,
Sobre a qual distendeste as azas funeraes!

Vae-te! Deixa da deusa a face casta e branca!
Arranca-me do seio as garras vis, arranca!"
E o corvo crocitou de novo: Nunca mais!