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IX

mencionar as navegações de Affonso de Xaintongeois até as boccas do Amazonas no anno de 1542, ser-nos-ia facil provar, que 25 annos mais tarde Henrique IV doara a um bravo capitão da religião reformada a immensa extensão de territorio, para a qual devia ir Ivo d’Evreux, sahindo do seu pacifico retiro de Montfort, afim de cathequisar os selvagens.

Vemos com effeito Daniel de la Touche, senhor de Ravardiere, de posse d’essas doações tão vagamente definidas pelas Cartas patentes de julho de 1605.[1]

Adquirimos tambem a certeza, que depois de dois annos, após duas viagens successivas ao norte do Brasil, Ravardiere decidio os Tabajaras e Tupinambás, propriamente ditos, a mandarem uma especie de embaixada ao Rei Christianissimo com o fim de solicitar sua protecção contra as invasões dos portuguezes.

Foi debalde esta missão d’indios, porem como Ravardiere continuasse a residir por muito tempo entre elles, conseguio em 1610, que lhe fossem renovadas as doações feitas cinco annos antes, e assim julgou-se authorisado, logo depois da morte de Henrique IV, a formar uma associação para a definitiva colonisação d’estas regiões abandonadas.[2]

Não foi comtudo aos partidistas de sua Religião, que se dirigio Ravardiere para ser bem succedido n’este empenho:

  1. Como se verá em outro lugar, logo após a publicação da primeira parte da viagem, a antiga expedição de Ravardière foi precedida pelas de Riffault em 1594, e de De-Vaux, o companheiro d’este ultimo, que misturando-se com os Indios dedicou-se muito ao descobrimento d’este paiz.
  2. Julgamos dever reproduzir aqui o texto d’esta concessão renovada: não conhecemos o primeiro. «Luiz, a todos os que virem a presente. Saude. O defunto Rei Henrique, o grande, nosso muito honrado senhor e pae, a quem Deos perdoe, tendo por Cartas patentes de julho de 1605 constituido e estabelecido o Sr. de Revardiere de la Touche, seo lugar-tenente general na America, desde o rio do Amazonas até a Ilha da Trindade, e havendo elle feito duas viagens ás Indias para descobrir as enseadas e rios proprios para o desembarque e estabelecimento de colonias, no que seria bem succedido, pois apenas chegou n’esse paiz soube predispôr os habitantes das ilhas do Maranhão e terra firme, os Tupinambás e Tobajaras, e outros a procurarem nossa protecção e sugeitarem-se á nossa authoridade, tanto por seo generoso e prudente procedimento, como pela affeição e inclinação natural, que n’estes povos se encontram para com a nação franceza, bem conhecida por elles pela remessa que fizeram dos seos embaixadores, que morreram apenas chegaram ao porto de Caucalle, e dos quaes teriamos ainda recebido iguaes protestos, segundo as narrações feitas pelo Sr. de Ravardiere, tudo isto depois nos daria occasião de lhe fazer expedir nossas Cartas patentes de outubro de 1610 para regressar, como Chefe, ao dito paiz, continuar seos progressos, como teria feito, e ahi demorar-se-ia dois annos e meio em paz, e 18 mezes tanto em guerra como em treguas com os portuguezes etc. etc.»
    Guardamos para a proxima publicação do livro de Claudio d’Abbeville, de que este é o complemento, todas as occorrencias politicas, relativas á expedicção, e reservamos tambem para ella os traços biographicos de Razilly, de Ravardiere e de Pezieux.