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correr tão depressa, do Oriente para o Occidente, quando troveja ao mesmo tempo sobre nós, e nas quatro partes do mundo, tanto na França, como sobre nós? Demais, si fosse homem, era necessario, que outro homem o fizesse, porque todo o homem procede de outro homem. Ainda mais: Jeropary é o creado de Deos, e nós não o vemos, ao passo que todo o homem se vê, e por isso não pensamos, que Tupan seja um homem.

Mas, repliquei eu, o que pensaes que elle seja?

Não sabemos, responderam, porem pensamos, que existe em toda a parte, e que fez tudo quanto existe. Nossos feiticeiros ainda não fallaram com elle, pois apenas fallam com os companheiros de Jeropary.

Eis a crença de Deos, sempre pela naturesa impressa nos espiritos dos selvagens, que com tudo não o reconheciam por meio de preces e de supplicios.

Acreditavam naturalmente nos espiritos bons e maus.

Chamam os bons espiritos ou anjos Apoiaueué, e os maos ou diabos Uaiupia.

Vou contar-vos o que pude colher de suas conversas por diversas vezes.

Pensam que os anjos lhes trazem chuva em tempo proprio, que não fazem mal ás suas roças, que não os castigam e nem os atormentam, que sobem ao Ceo para contar á Deos o que se passa aqui na terra, que não causam medo nem á noite e nem nos bosques, que acompanham e protegem os francezes.

Pensam, que os diabos estão sob o dominio de Jeropary, que era creado de Deos, e que por suas maldades Deos o despresou, não querendo mais vêl-o e nem aos seos, pelo que aborrecia os homens e nada valia: que os diabos impedem as vindas das chuvas em tempo proprio, que os trazem em guerra com seos inimigos, que os maltrata, e lhes faz medo, habitando ordinariamente em aldeias abandonadas, especialmente em logares onde tem sido sepultados os corpos de seos parentes.