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ruinas os modestos edificios, que attestam esta epocha, provando com isto, e ao mesmo tempo, ausencia de patriotismo mesquinho e sentimento de bom gosto.[1]

Mas voltando ao livro, que nos prende a attenção, façamos conhecer a sorte caprichosa, que o esperava em França. Despertaremos tambem com o bom Religioso algumas reminicencias, com que se pode enfeitar a poesia.

Menos infeliz na apparencia que João de Lery, tão bem classificado com o appellido de «Montaigne dos velhos viajantes,»[2] Ivo d’Evreux durante 15 annos não vio seo manuscripto, extraviado por um infortunio, que o ferio completa e absolutamente.

Enviado aos Superiores da Ordem este livro, complemento do de Claudio d’Abbeville, foi destruido antes de haver apparecido. Impresso por Francisco Huby, em cujas officinas já havia sido edictada a obra do seo companheiro, foi inteiramente dilacerado.

Francisco Huby, dizemos com pezar, deixou-se n’essa occasião seduzir, e esquecendo-se dos deveres inherentes á sua profissão, não se importou em ser o instrumento d’uma vingança politica tão mesquinha.

É de suppôr, que o motivo, que fez prender Ravardiere no Forte de Belem, levantou tambem mãos sacrilegas para destruir na rua de São Thiago o precioso volume, no qual

  1. Informações inexactas sem duvida fizeram com que Mr. Ferdinand Diniz mencionasse aqui este facto, nunca acontecido. — Do traductor.
  2. Lembro-me com prazer duma delicada expressão do sabio Augusto de Saint Hilaire.
    Lery, como se sabe, viajou pelo Rio de Janeiro no tempo de Villegagnon, isto é em 1556. A primeira edicção da sua interessante narrativa somente appareceu em 1571. Nosso Ivo d’Evreux, cujo estylo tem tantos pontos de contacto com o d’este escriptor, leria seo livro? N’elle nada encontramos, que nos leve a responder pela afirmativa. Multiplicaram-se porem as edicções de Lery e a tal ponto, que a quinquagesima e ultima foi em 1611.