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toda. Heide prostrar-me na sua presença, heide humilhar-me deante do filho de minha filha, heide arrastar na poeira de seus pés éstas cans e éstas rugas... morrerei de vergonha e de remorsos deante do meu filho, mas elle hade saber a verdade.'

Sahiam com tal impeto e com tam desacostumada energia éstas mysteriosas e tremendas palavras da bôcca da velha, que Fr. Diniz não ousou contê-la; ouviu até ao fim, deixou quebrar o impeto da torrente, e erguendo então a sua voz austera mas pousada, disse n’aquelle tom friamente decisivo que tanto impõe aos animos apaixonados:

— 'Se tal fizesse, mulher, a minha maldicção, a maldicção eterna de Deus sôbre a sua cabeça para sempre!... Oh mulher, pois não lhe basta que elle me abhorreça — não lhe basta que seu neto lhe perdesse o amor... quer... quer tambem que nos despreze?'

A velha gemeu profundamente, e, por um geito de antiga reminiscencia, levou as mãos aos olhos como se os tapasse para não ver. Então disse com desconsoladas lagrymas na voz:

— 'A vontade de Deus seja feita!'