Página:Viagens na minha terra, v1 (1846).pdf/218

Wikisource, a biblioteca livre
— 204 —


A luz baça do crepusculo, coada ainda pelos ramos das árvores, illuminava tibiamente as expressivas feições da donzella; e as fórmas graciosas de seu corpo se desenhavam molle e voluptuosamente no fundo vaporoso e vago das exhalações da terra, com uma incerteza e indecisão de contornos que redobrava o incanto do quadro, e permittia á imaginação exaltada percorrer toda a escalla d’harmonia das graças femininas.

Era um ideal do demi-jour da coquette parisiense: sem arte nem estudo, lh’o preparára a natureza em seu boudoir de folhagem perfumado da brisa recendente dos prados.

Como n’essas poeticas e populares legendas de um dos mais poeticos livros que se tem escripto, o Flos-sanctorum, em que a ave querida e fadada accompanha sempre a amavel sancta de sua affeição — Joanninha não estava alli sem o seu mavioso companheiro. Do mais espêsso da ramagem, que fazia sobreceo áquelle leito de verdura, sahia uma torrente de melodias, vagas e ondulantes como a selva com o vento, fortes, bravas, e admiraveis de irregularidade e invenção, como as barbaras endeixas de um poeta selvagem