Gonzaga de Sá interrompeu-me estas vagas cogitações:
— Por que razão se vive? Que tu vivas, vá! Tu vives das tuas angústias, das tuas dores, dos clarões de alegria que por vezes rebetam entre elas; mas este pobre diabo, cujo stock de noções e conceitos era reduzidíssimo para forjar dores e, portanto, para obter alegrias, porque viveu? Sabes?
— Foi a inércia.
Dentro em pouco, tomamos o bonde e viajamos silenciosamente. O veículo encheu-se do curioso público de Domingo. Gonzaga de Sá mantinha-se calado, de quando em quando olhava um pouco a rua, depois descansava as mãos na bengala, baixava a cabeça e se punha a ver o chão da rua, por entre as grades do assoalho do veículo. Quando saltamos, quis-me despedir dele. Não deixou.
— Janto na cidade. Fica! Vamos andar pelas ruas. Por exemplo: vamos ao Passeio Público.
— Vamos.
Ele amava o velho jardim, onde nos sentamos pouco depois em um banco de pedra, num lugar retirado, ouvindo ao longe o estrondo da banda de música domingueira. A calma do lugar foi-nos aos poucos penetrando.