Poesias posthumas do Dr. Aureliano José Lessa/A’ Diamantina (I)
Vês lá na encosta do monte
Mi casas em gruposinhos,
Alvas, como cordeirinhos
Que se lavaram na fonte?
Não vês deitado defronte,
Qual dragão petrificado,
Aquelle sêrro curvado
Que mura a cidadesinha?
Pois essa cidade é minha,
E’ meu berço idolatrado.
Ali, meus olhos se abriram
A’ luz matinal da vida;
Lá, primeiro á mãi querida
Meus labios de amôr sorriram;
Lá, seu nome proferiram
Antes do nome de Deus;
Lá, tentei os passos meus
Da vida na estrada rude;
Lá, aprendi a virtude,
Minha mãi, nos labios teus.
Olha como ella se inclina
Pela esmeralda do monte,
Molhando os pés n’uma fonte
De agua fresca e crystallina!
Olha como ella domina
Esses serros alcantís,
Com seus ares senhorís,
Com seu cofre de diamantes,
No meio de seus amantes
Distribuindo rubis…
Salve, Athenas tão risonha
Da verde e saudosa Minas,
Raïnha destas collinas
Que banha o Jequitinhonha,
Teu vassallo. Elle nem sonha
Quebrar teu jugo real,
E vem a um leve signal
Com seus rubis, com seu ouro,
Derramar no teu thesouro
O seu tributo annual.
Feliz quem no seio teu
O sôpro da Providencia
Faz brotar a intelligencia,
Pérola fina do céo!
Como da noite no véo
Faz mil pérolas fulgir,
Tu tens, ó rival de Ophir,
Outras joias, outros brilhos;
Teu thesouro são teus filhos,
Tua glória é seu porvir!
Seu porvir, sim, que amanhece
Lá nos longes do futuro;
Não o meu, que um fado escuro
De negros fios só tece.
Patria! tudo me fallece
Para erguer teu esplendor:
Mas do pobre trovador
Terás o obolo pobre,
No peito um coração nobre,
Na lyra um canto de amôr.