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Poesias posthumas do Dr. Aureliano José Lessa/Aos annos de uma Senhora

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AOS ANNOS DE UMA SENHORA


Nunc preciosissimus annus.


Hoje o teu anjo mais um élo enlaça
Na dourada cadêa de teus annos
Enramada de flôres:
Teu sol radia sem fanar-te a graça,
Celebra os teus dotes soberanos
O genio dos amôres.

Virgem, é bella a aurora de teus dias,
Bello o teu deslisar na flórea senda
Da fresca juventude:
Não deslustram teu céo nuvens sombrias,
Nem do infortunio a mão rasgou-te a venda
Da placida virtude.

Inda na margem da existencia cantas
C’ os sorrisos nos labios, desfolhando
A rosa das delicias;
Do tempo as ondas vem lamber-te as plantas
E para a outra margem vão levando
De teu ser as primicias.

E tu passas além—não vêm teus olhos
O marco assente ás bordas do caminho
Onde um anno se conta…
Assim o alcyon por entre escólhos
Vai descuidoso demandar seu ninho
Lá onde o sol desponta.

Mas eu, que proseguindo nos teus passos
Chóro os meus dias, conto-te os momentos
Da renovada aurora,
Hoje na lyra vibro uns sons escassos,
Quero ajuntar teu nome aos meus accentos
Na cythara sonóra.

Escuta: a fonte da vida
Límpida sempre não passa,
Lá vem a mão da desgraça
Suas ondas perturbar.

Nesta viagem terrestre
O caminho é bronco e rude,
Só a dextra da virtude
Póde os teus passos guiar.

Ha na terra um véo celeste
Que protege a existencia,
E’ o manto da innocencia,
Da virtude o santo véo.

Goza, ó virgem, do perfume
Dessa flôr da mocidade,
Que a patria da felicidade
Sómente existe no céo.

Sê feliz: corram-te os annos
Bem como a lua na esphera;
E de tua primavera
Sê tu a mais bella flôr.

Em quanto as auras da vida
Teu baixel vão bafejando,
Ama sorrindo, cantando:
—Deus, a Virtude, o Amor!—