Reflexões sobre a Vaidade dos Homens (1980)/LXVII
Todos conhecemos os delírios, a que a vaidade nos incita, mas nem por isso deixamos de os seguir. Parece que cada um de nós tem duas vontades sempre opostas entre si; ao mesmo tempo queremos, e não queremos; ao mesmo tempo condenamos, e aprovamos; ao mesmo tempo buscamos, e fugimos; amamos, e aborrecemos. Temos uma vontade pronta para conhecer, e detestar o vício; mas também temos outra pronta para o abraçar; uma vontade nos inclina, a outra arrasta-nos; a vontade dominante, é a que segue o partido da vaidade; por mais que queiramos ser humildes, e que tenhamos vontade de desprezar o fausto, a vontade contrária sempre vence, e se acaso se conforma, a violência com que o faz, é um sacrifício. A vaidade é uma espécie de concupiscência, não se lhe resiste com as forças do corpo, com as do espírito sim; a carne não é frágil só por um princípio, mas por muitos, e a vaidade não é o menor deles.