Reflexões sobre a Vaidade dos Homens (1980)/XLVIII
É próprio da vaidade o dar valor a muitas cousas, que o não têm, e quási tudo o que a vaidade estima, é vão. Que cousa pode haver, que tenha em si menos substância do que umas certas felicidades, que ponderada a melhor parte delas, consiste, ou em palavras, ou em gestos; a denominação de grande, de maior, e de excelente, e as submissões, que indicam o respeito, fazem uma parte essencial das glórias deste mundo; a primeira não consiste mais do que em palavras; a segunda toda se compõe de gestos. Que importa à felicidade do homem, que os outros, quando lhe falam, articulem mais um som, que outro, e que nas reverências que introduziu a lisonja, se dobrem mais, ou menos? A vaidade nos faz crer felices à proporção, que ouvimos esta, ou aquela voz, e que vemos este, ou aquele culto: a vida civil se reduz a um ceremonial composto de genuflexões, e de palavras.