Terceiro Discurso de Investidura do Senhor Franklin D. Roosevelt
Terceiro Discurso de
Investidura
do Senhor

EM CADA dia que a naçāo consagra à Investidura Presidential, desde 1789, o povo
tem renovado o seu sentimento de lealdade
aos Estados Unidos.
No tempo de Washington, a faina do povo era a de criar e fundir uma naçāo.
No tempo de Lincoln, a faina do povo era a de proteger essa naçāo contra o desmembramento por causas internas.
E nestes dias, a faina do povo é a de salvar essa naçāo e as suas instituiçōes contra o desmembramento por causas externas.
Chegou-nos a hora para que, no meio de vertiginosos acontecimentos, nos demoremos um instante para meditar e relembrar o que tem sido o nosso lugar na história, e nos informemos de novo sobre o que somos e o que poderemos chegar a ser. Senão, corremos risco certo da inaçāo.
Nāo é a contagem dos anos que determina a vida de uma naçāo, mas sim a perduraçāo do espirito humano. Dura quatorze lustros a vida do homem: talvez um pouco mais, talvez um pouco menos. Mas a vida de uma naçāo é determinada pela plenitude da sua vontade de viver.
Há quem duvide isto. Há quem acredite que a democracia, como forma de govêrno e norma de vida, está restrita ou demarcada por uma espécie de destino artificial e místico; que, por algum motivo inexplicável, a tirania e escravidāo chegaram a ser a vaga crescente do futuro; e que a liberdade nāo é nada mais que uma maré vazante.
Mas nós que somos americanos sabemos que isto nāo é verdade.
Há oito anos, quando a vida desta República parecia paralizada por um terror fatalista, nós comprovamos que isto nāo estava certo. Nós nos encontrávamos num estado de comoçāo violenta, mas nós agimos. Agimos prontamente, com audácia e com decisāo.
Estes últimos anos têm sido anos de vida intensa e frutífera para o povo desta democracia. Eles nos brindaram uma segurança maior, e confio que também nos brindaram uma compreensāo mais cabal da verdade que para medir os ideais da vida é preciso mais que cousas materiais.
De extrema importância para o nosso presente e futuro é esta experiência de uma democracia que conseguiu sobreviver uma crise interna; que expeliu muitos males; que erigiu novos conceitos sôbre bases duradouras; e que, a-pesar de tudo, conservou a realidade da sua democracia.
Pois a nossa açāo desenvolveu-se de acôrdo com os três poderes estabelecidos pela Constituiçāo dos Estados Unidos. Os ramos coordenados do governo continuam a funcionar livremente. A Declaração de Direitos permanece inviolada. A liberdade do voto é sustentada. Os profetas da queda da democracia americana viram que os seus vaticínios de mau augúrio deram em nada.
A democracia nāo está se extinguindo.
Isto nós sabemos porque a vimos reviver e crescer.
Sabemos que nāo pode extinguir-se, porque tem por fundamento a iniciativa desimpedida e individual de homems e mulheres unidos em um empreendimento comum, iniciado e levado a efeito pela livre expressāo de uma livre maioria.
Nós o sabemos porque ùnicamente a democracia, entre todas as formas de governo, alista a energia total da vontade esclarecida do homem.
Nós o sabemos porque ùnicamente a democracia conseguiu estabelecer uma civilizaçāo ilimitada que permite um progresso infinito no melhoramento da vida humana.
Nós o sabemos porque, se olharmos debaixo da superfície, perceberemos que ela continua a propagar-se em todos os continentes, porquanto é, de tôdas as formas de sociedade humana, a mais humanitária, a mais adiantada, e afinal a mais invencível.
Uma naçāo, como uma pessoa, tem um corpo que precisa ser alimentado, vestido e agasalhado, avigorado e repousado, num modo que se amolde aos objetivos dêste tempo.
Uma naçāo, como uma pessoa, tem uma mente que é preciso manter sempre informada e alerta, que deve conhecer-se a si mesma, e que compreende as esperanças e necessidades dos seus vizinhos, isto é, tôdas as outras naçōes que vivem dentro do círculo cada vez mais estreito do mundo.
E uma naçāo, como uma pessoa, possue algo de mais profundo, mais permanente, e maior que a soma de todos os seus componentes. É justamente essa diferença que tem mais importância para o seu futuro, que invoca a proteçāo mais sagrada do seu presente.
É uma cousa que achamos difícil e mesmo impossível definir numa única palavra simples.
No entanto, todos sabemos o que é: o espírito, a fé da América. É o produto de séculos. Brotou das multidōes que vieram de outras terras, sendo alguns indivíduos de alto calibre, mas a sua maioria constituída de gente simples, que aquí procuravam encontrar a todos os tempos a liberdade por um caminho mais franco.
A aspiração democrática nāo é meramente um aspecto hodierno da história da humanidade. Ela é a própria história da humanidade. Ela se entreteceu na vida antiga de povos primitivos. Flamejou de novo na Idade Média. E ficou consagrada na Magna Carta.
Nas Américas o seu impeto tem sido irresistível. A América tem sido o Novo Mundo em tôdas as línguas e para todos os povos, nāo porque êste continente tivesse sido terra recém-descoberta, mas sim porque todos os que aquí aportaram abrigavam a esperança de que aquí poderiam criar nova vida—vida que seria nova por sua liberdade.
A sua vitalidade foi inscrita no nosso Convênio do Mayflower, na nossa Declaraçāo de Independência, na Constituiçāo dos Estados Unidos, e no Discurso de Gettysburg.
Aqueles que primeiramente vieram para cá para realizar os anelos do seu espírito, e os milhōes que os seguiram, e as geraçōes que dêles emanaram, todos avançaram constantemente no sentido de um ideal que por si mesmo ganhou vulto e clareza de geraçāo em geraçāo.
As esperanças da República nāo podem tolerar para sempre a pobreza imerecida nem a riqueza egoísta.
Sabemos que ainda temos muito que fazer: que temos que pôr em plano de maior firmeza a segurança, as oportunidades, e a sabedoria de todo cidadāo, dentro das medidas justificadas pelos recursos e aptidōes da terra.
Mas nāo é bastante que se realizem só estes objetivos. Nāo é bastante vestir e alimentar o corpo desta naçāo, e instruir e informar a sua mente. Pois também precisamos tomar em consideraçāo o espírito. E dos três, o espírito é o de maior importância.
Sem o corpo e a mente, como todos sabemos, a naçāo nāo poderia viver.
Mas se e espírito da América fosse destruído ainda quando o corpo e a mente da naçāo continuassem a viver constringidos num mundo estranho, a América que conhecemos teria perecido.
Esse espírito, essa fé, comunica-se conosco na nossa vida diária de maneira que às vêzes passa despercebido, porque nos parece tāo evidente. Comunica-se conosco aquí na Capital da Naçāo. Comunica-se conosco por meio dos processos de govêrno nas soberanias de quarenta e oito estados. Comunica-se conosco nas nossas municipalidades, nas nossas cidades, nas nossas aldeias e povoados. Comunica-se conosco desde as outras naçōes deste Hemisfério, desde as do outro lado dos mares, as escravizadas como também as livres. Às vêzes deixamos de ouvir ou fazer caso dessas vozes de liberdade, porque para nós o privilégio da nossa liberdade já é uma velha tradiçāo.
O destino da América foi proclamado pelas palavras proféticas pronunciadas pelo nosso primeiro presidente no seu primeiro discurso de investidura em 1789, palavras estas que parecem dirigidas a êste ano de 1941: “A conservaçāo do fogo sagrado da liberdade e o destino da forma republicana de govêrno sāo considerados com razāo. . profundamente . . . finalmente, comprometidos no experimento confiado às māos do povo americano.”
Se nós perdermos esse fogo sagrado, se nós permitirmos que seja asfixiado com dúvidas e temores, entāo teremos rejeitado o destino que Washington procurou estabelecer com tanto valor e com tanto triunfo. A conservaçāo do espírito e da fé da naçāo nos proporciona e continuará a proporcionar-nos a justificaçāo mais elevada de cada sacrifício que tenhamos que fazer pela causa da defesa nacional.
Ante os grandes perigos nunca dantes encontrados, o nosso objetivo decidido é o de proteger e perpetuar a integridade da democracia.
Para este fim, alistamos o espírito da América e a fé da América.
Nós nāo retrocedemos. Nāo nos contentamos permanecendo imóveis. Como americanos, seguimos adiante, no serviço da nossa naçāo, pela vontade de Deus.

Este trabalho está em domínio público nos Estados Unidos por tratar-se de uma obra do Governo dos Estados Unidos (veja 17 U.S.C. 105).
