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Uma Campanha Alegre/II/II

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II

Janeiro 1872.

Anda às vezes uma lancha quarenta e oito horas sob a chuva, o vendaval e a neblina, na inclemência da água. Os homens estão perdidos e trabalhados, como dizia

Camões. É necessário passar a noite no mar. Deitam a âncora e as redes, acendem uma lanterna, persignam-se, e, sob a escuridão e a tormenta, embuçados nos gabões, encharcados, ali ficam no vasto mar escuro. Tudo isto para erguer as redes vazias, quantas vezes rotas! Vão homens e vão crianças. Um homem de companha ganha 80 réis por cada pesca, dois dias de trabalho áspero. Uma criança ganha um vintém. E necessário ver como habitam. Em Espinho — e é uma das costas mais populosas e mais ricas — vivem em casebres de pau, onde a chuva, o vento, a névoa, entram livremente; dormem sobre farrapos de velhas jaquetas e de antigas velas inúteis; comem numa grande tigela, promiscuamente, a caldeirada escassa de sardinha e côdeas de broa. Isto no tempo feliz e abundante. No Inverno internam-se e pedem esmola. Tal é aquela vida a traços largos. Escusamos falar-lhe, sr. ministro, dos temporais, dos naufrágios, de barcos partidos, de redes inutilizadas, do fim deles sobre a terra, que é o hospital, do seu fim debaixo da terra, que é a vala. Vir sobre estes homens o fisco, e tirar-lhes, por meio de unia conta de dividir, parte daquilo que eles ganham por meio de um risco de morrer, era excessivamente torpe, mesmo para portugueses! Os pescadores têm, sr. ministro, um verdadeiro imposto: as grandes ondas que viram as lanchas.

Agradecemos, sr. ministro, a sua simpática iniciativa.

Ao Ex.mo Sr. Fontes Pereira de Melo. — Vimos agradecer-lhe, sr. ministro, a proposta pela qual é extinto o imposto do pescado. As Farpas tinham apresentado, com um relevo doloroso, toda a cruel indignidade desse imposto. Não sabemos se V. Exª já viveu algum tempo nas costas de Portugal. Devia-o ter feito. Nada mais duramente instrutivo. Um interior de cabana ensina mais que um livro de Maurício Block. (Mesmo os livros do dito Maurício não ensinam nada).

no match

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A pesca não constitui uma indústria regular, mas um ganho de surpresa. O mar, sr. ministro, não tem a calma tranquilidade da terra. Essa estende-se ao sol, como a ninfa antiga, e deixa serenamente na sua impassibilidade santa que a violem, a dilacerem, lhe tirem o vinho, o pão, as frutas, até o carvão, e aos que a rasgam e roubam dá tudo o que é necessário para que o corpo viva, e ainda a mais as verduras e as flores para que a alma se alegre. O mar, sr. ministro, esse, defende-se. Olha o homem como um inimigo; cerca-se de rochas, embuça-se traidoramente na névoa, apavora com o seu ladrar monótono. É necessário espreitá-lo, ver quando dorme: então o pescador, rema em silêncio, deita as redes, e rouba-o. Já vê, sr. ministro, que não temos aqui uma indústria disciplinada — mas a pirataria da fome.