Vida e Feitos D' El-Rey Dom João Segundo/CLXV

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E no anno seguinte de mil e quatrocentos e noventa e tres, estando el-rey no lugar de Val de Parayso que he acima do Moesteyro das Vertudes, por caso das grandes pestes que nos lugares principaes daquela comarca avia, a seis dias de Março veo ter a Restello em Lixboa, Christovão Colombo ytaliano que vinha do descubrimento das ylhas de Cipango e Antilhas que per mandado d' el-rey e da raynha de Castella tinha descuberto. Das quaes trazia consigo as mostras das gentes, e ouro e outras cousas que nellas avia e foy dellas feyto almirante. E sendo el-rey disso avisado o mandou chamar e mostrou por ysso receber nojo e sentimento, assi por crer que o dito descobrimento era feyto dentro dos mares e termos de seus senhorios de Guine, como porque o dito Colombo por ser de sua condiçam alevantado, e no modo do contar das cousas fazia isto em ouro e prata e riquezas muito mayor do que era, e acusava el-rey por se escusar deste descubrimento e nam no querer mandar a isso pois primeiro se lhe viera oferecer que aos reys de Castella, e que fora por lhe não dar credito. E el-rey foy cometido que ouvesse por bem de lho matarem ahi, porque com sua morte o descubrimento nam hiria mais avante de Castella. E que dando sua alteza a isso consentimento se poderia fazer sem sospeita, porque por elle ser descortes e alvoroçado podiam com elle travar de maneira que cada hum destes seus defeitos parecesse a causa de sua morte; mas el-rey como era muy temente a Deos nam somente o defendeo mas aynda lhe fez honrra e merce e com ela o despedio.

E cuidando el-rey bem o negocio e peso deste caso se foy logo a Torres Vedras, onde logo sobre ysso teve conselhos em que foy determinado que armasse contra aquellas partes hũa grande armada que logo mandou fazer com grande deligencia, e fez capitão-mor della, Dom Francisco d' Almeida que depoys foy ho primeyro viso-rey da India, homem de muita confiança e muyto bom cavalleyro. E sendo ja ha armada prestes chegou a el-rey hum mesageiro d' el-rey e da raynha de Castella; os quaes por serem certeficados que a dita armada hia contra outra sua que logo laa avia de tornar, mandaram requerer a el-rey que a nam mandasse até se ver per dereito em cujos mares e conquista ho dito descubrimento cabia. Pera o qual mandasse a elles seus embayxadores e precuradores com todallas cousas que fizessem por seu titolo, e segundo rezam e justiça elles se justificariam, e concertariam como fosse dereyto. Polo qual el-rey deyxou de mandar a dita armada, e sobre ysso mandou logo aos ditos reis o doutor Pero Dias, e Ruy de Pina que da verdade bem enformados foram a elles que estavam em Barcelona ao tempo que per el-rey Carlos de França se fez a segunda concordia e entrega de Perpinham, e do condado de Roselham em Catelunha. E os ditos precuradores não tomaram com os ditos reis concrusão algũa, e a causa foy por lhe socederem assi prosperamente suas cousas com França, e principalmente porque ante de tomarem concerto sobre a dita conquista, ylhas e terras, quiseram outra vez ser certificados de toda a verdade dellas e de tudo o que nellas avia, pera que jaa tinham enviados seus navios que ainda nam eram tornados, porque segundo fosse a estima das ditas terras assi se concertariam. E pera dilatarem este negocio que nam parecese que o faziam por esperar a dita armada e passar este tempo sem se tomar concrusam ordenaram de enviar a reposta a el-rey por seus embaixadores e assi lho mandaram dizer.