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O PRECURSOR DO ABOLICIONISMO NO BRASIL
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Fugiu da casa do amo, “depois de obter ardilosa e secretamente provas inconcussas de sua liberdade.”[1]

Esta frase da Carta é outro ponto cheio de indagações. Que Gama provou cabalmente a sua qualidade de homem livre, filho de mulher liberta, não ha a menor dúvida. Seria preciso não conhecer os antecedentes do alferes Cardoso para admitir a hipótese de que este tivesse cedido a considerações altruisticas, num tempo em que ninguem as usava, e tivesse recuado no seu proposito de reconquistar o moleque. E é o proprio Gama quem mostra a qualidade de teima do senhor, quando refere, na Carta, por que razão se suicidou o alferes, ali por volta de 70 ou 72: no ato de o prenderem por haver morto, á fome, alguns escravos, por ele longamente mantidos em cárcere privado.

Não é, portanto, possivel duvidar de que Luiz Gama, com as provas, tirou ao teimoso a vontade de pleitar a sua recondução ao cativeiro. Esses documentos foram naturalmente destruidos, juntamente com todo o arquivo da escravidão, por obra daquela celebrada Circular nº 29, de 13 de maio de 1891, que Rui Barbosa

  1. Cabe aqui relatar o segundo episódio de Gama, narrado pelo mesmo sr. Antonio dos Santos Oliveira. Parece que não foi semente Prado Junior que deu lições a Luiz Gama. Entusiasmado pelos ensinamentos que o joven amigo lhe ministrara, o pretinho resolveu empregar-se como servente ou zelador do conhecido Colegio Isidoro, que ficava na Ladeira Porto Geral. E ao mesmo tempo que servia, estudava, aproveitando todos os minutos de folga que lhe davam as suas tarefas de empregado. Dizem que era infalivel vê-lo com o livro na mão, numa ânsia de aprender depressa, tratando de rehaver o tempo perdido.