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SUD MENNUCCI

que se lê e se pode reler com prazer, hoje, e que se lerá por muito tempo ainda, porque nele Gama castiga defeitos e faltas universais. E se tal não tem transparecido, como devia, no estudo de sua feição marcadamente satírica é porque, regra geral, todos os seus pretensos biógrafos, sem excetuar Alberto Faria, para mostrar que lhe leram as composições, citam invariavelmente os versos da poesia “Quem sou eu?”, trabalho que o povo recrismou de “Bodarrada”, titulo por certo muito mais expressivo e muito mais adequado que o outro. Ora, se “A Bodarrada” pode considerar-se a produção mais feliz que lhe saiu da pena, absurdo seria supor que, lidando ele tantos anos no jornalismo, e tendo-se valido sempre da zombaria e do rídiculo como armas de ataque, Gama só tivesse escrito de verdadeiramente aproveitavel aqueles versos. E se a sua feição artística se estereotipou, em nossa literatura, por meio daquele clichê, deve-se isso exclusivamente ao fato de haver Silvio Romero, na segunda edição de seu livro máximo, dado relevo ao trabalho, citando-o na íntegra. E invariavelmente ou quasi, a poesia que os críticos e biógrafos do negro, lhe citam, é a conhecida “Bodarrada”.

Gama, entretanto, que é satírico, de verdade, que ama rir á custa da sandice, das contradições e das tolices alheias, que chega a ser ácido muita vez, aparentando, não raro, mau estomago, descendo mesmo ao impropério se isso lhe dá ganas, tem muitas outras páginas interessantissimas, que vale a pena recordar.