À morte de Affonso de A. Coutinho Nesseder, estudante da Escola Central
Who hath not lost a friend?...
M.
É triste ver a flor que desabrocha
Ou quer no prado, ou na deserta rocha,
Pender no fraco hastil!
É bem triste dos anos nos verdores
Morrer mancebo, no brotar das flores,
Na quadra juvenil!
Meu Deus! tu que és tão bom e tão clemente,
P'ra que apagas, Senhor, a chama ardente
Num crânio de vulcão?
P'ra que poupas o cedro já vetusto
E, sem dó, vais ferir o pobre arbusto
Às vezes no embrião?!...
Pois não fora melhor vivesse a planta
Cujo perfume a solidão encanta
No sossego do val?...
- Não veríamos nós neste martírio
Desfalecer tão belo o pobre lírio
Pendido ao vendaval!
Pobre mancebo! Nesse peito nobre
E nessa fronte que o sepulcro cobre
Era fundo o sentir!
Agora solitário tu descansas,
E contigo esse mundo de esperanças
Tão rico de porvir!
Oh! lamentemos essa pura estrela
Sumida, como no horizonte a vela
Nas névoas da manhã!
A sepultura foi há pouco aberta...
Mas o dormente já se não desperta
À voz de sua irmã!
É mudo aquele a quem irmão chamamos,
E a mão que tantas vezes apertamos
Agora é fria já!
Não mais nos bancos esse rosto amigo
Hoje escondido no fatal jazigo
Conosco sorrirá!
Mancebo, atrás da glória que sorria,
Sonhou grandezas para a pátria um dia,
E a ela os sonhos deu;
Mártir do estudo, na ciência ingrata
Bebeu nos livros esse fel que mata
E pobre adormeceu!
Era bem cedo! - na manhã da vida
Chegar não pôde à terra prometida
Que ao longe lhe sorriu!
Embora desta estrada nos espinhos
Feliz tivesse os maternais carinhos,
Cansado sucumbiu!
Era bem cedo! - Tanta glória ainda
O esperava, meu Deus, na aurora linda
Que a vida lhe dourou!
Pobre mancebo! no fervor dessa alma
Ao colher do futuro a verde palma
Na cova tropeçou!
Dorme pois! Sobre a campa mal cerrada,
Nós que sabemos que esta vida é nada
Choramos um irmão;
E d'envolta c'os prantos da amizade
Aqui trazemos, nos goivos da saudade,
As vozes da oração!
Eu que fui teu amigo inda na infância,
Quando as almas das rosas na fragrância
Bendizem só a Deus -
Hoje venho nas cordas do alaúde
Sentido e grave, à beira do ataúde
Dizer-te o extremo adeus!
Descansa! se no céu há luz mais pura,
De certo gozarás nessa ventura
Do justo a placidez!
Se há doces sonhos no viver celeste,
Dorme tranqüilo à sombra do cipreste...
- Não tarda a minha vez!
Maio - 1858.